segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

Querido Pedro,

Acaso não lembras de cada momento que passamos juntos? De cada beijo compartilhado debaixo dos pingos da chuva que nos molhava naquele dezembro? O que poderá ter acontecido para que você tenha deixado de lado todas as fotografias vivas da nossa convivência?
Estou triste por não te ter mais por inteiro nos meus braços. Estou triste por ter sido tão inconstante com você.
Não vamos mais uma vez trocar acusações... Erramos juntos, e, se você não quer se responsabilizar eu assumo tudo sozinha.
Soube que sua vida tomou outro rumo. Outra ocupou o lugar que era meu desde sempre. Isso me abateu, mas mantive meu queixo erguido. O caso é que agora temos algo a mais para nos preocuparmos.
Passaram-se seis meses desde o nosso último encontro. Meus pés estão enormes, meu peso dobrou e aquela blusa de cambraia que você me deu em Fortaleza não me cabe mais.
Ontem, quando vinha da segunda ultrassonografia pensei em te ligar. É uma menina e se chamará Heloíse.
Não sei se você se importa com isso, mas, achei bom te avisar.
Talvez você seja tão covarde como foi comigo... esta é a chance que você tem para se redimir. Você me negou, negará também a nossa filha?
Espero não ter te surpreendido. É que se eu te avisasse antes tenho certeza de que você me pediria para mata-la. Heloíse vai nascer, quer você queira ou não.

Não pretendo por fim naquilo que você julga ser a sua felicidade. Não pretendo te pedir nada.
Eu só quero que você saiba que nascerá de mim uma parte de   você, mas que não sei se terá seu nome.

Desculpa pelo tempo que te roubei. 

Amélia

nº 3


De pijama laranja ela digitava freneticamente algumas memórias no editor de texto de costume.  Memórias tristes que lhe arrancavam lágrimas sangrentas. Alguma coisa estava fora do lugar, mas o que seria essa coisa que queria absorve-la? Que era essa tempestade cósmica de sentimentos que roubava-lhe o sorriso?

A ânsia de viver sem perder nenhum segundo, a liberdade concedida em demasia, as mudanças vorazes tornavam a vida dela sem tanto sentido assim.
Ela temia ser medíocre, mas o era por não saber lidar consigo.
Se ela saiu de mais essa crise? Ainda não sei. Ainda são necessárias muitas memórias em frente ao computador.

sábado, 17 de dezembro de 2011

Espera


Esperei com um pingo de desespero a tua volta. Esperei tanto que dormi com a televisão ligada. Espero de mais a tua volta que parece nunca chegar.
Já atrasei relógio. Já o adiantei.
Não sei mais o que fazer pra preencher essa falta, maldito vazio que tu me fazes carregar no peito.
Esperei com os olhos carregados de desespero a tua volta.
Esperei. Hoje não mais.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

O caso do bêbado

O homem que bebe um copo atrás do outro, que mistura cerveja com vodca e rum é aquele mais se queixa da vida, do seu legado de inexistência social. Ele sofre por ver sua causa morta. O mesmo homem, agora sentado no meio fio, encostado num poste, fecha os olhos e sonha com as mesmas coisas que sonhou quando mais jovem, quando ainda não bebia tanto quanto hoje. Ele acaba deitando na calçada. As pessoas passam, criticam, o chamam de bêbado.Talvez o bêbado não fosse tão infeliz se uma das almas que passam nas calçadas tivesse mesmo a intenção de lhe mostrar que a resolução dos nós que a vida dá não estão dentro de um copo suado de cerveja.
O bêbado, deitado na calçada da igreja poderia não existir se as pessoas tivessem saído de dentro de suas muralhas eclesiais e realmente se importassem com o que acontece aqui do lado de fora. Que humanismo é este que defendem e pregam? Isso pra mim é mais um cristianismo podre revestido de crueldade.
O padre reza a missa. O pastor encerra o culto. O homem continua caído. Os (in) fiéis dizem que aquela criatura está possuída pelo demônio, por essa razão ele se encontra naquele estado.
Eu me pergunto quem realmente é o demônio.


Aquele homem

Painel "Homem Lendo o Jornal", da série "Bancos de Praça", 1999, acrílico sobre tela - por Mari Lopes
Sentado na praça, tendo ao lado um caderno e um livro. Foi interessante observar aquela figura. Uma criatura infeliz. O conheci quando eu ainda fazia parte de uma comunidade católica. Não sei se é efeito colateral da religião, mas, aquele homem é vítima daquela verdade que lhe insuflaram. Possui uma deficiência física e por acreditar que aquilo foi castigo de um deus qualquer que ele acredita, permanece naquele estado de inércia entre aquilo que lhe parece ser a conduta correta e aquilo que realmente lhe enche os olhos de felicidade.

Os motivos - Capítulo I


Então, já sentes aquele perfume de lavanda que entra porta adentro? Já não sentes mais aquela calma por teu olfato reconhecer tal cheiro, não é? Essa urgência destemperada cheirando a almíscar sintético que te deprime, reprime teus sonhos e exala teus pesadelos.Essa carícia no tempo que vem no vento junto com as tuas palavras convertidas em breu pela tua luz. Então andas às voltas com teus problemas, poemas de uma vida mascarada de solidão e medo. O que és, então? Perguntei-te mil vezes. Respondeste-me por último. Daí fechei os olhos, o coração e extingui minha religião.




Se fosse só sentir saudade, mas tem sempre algo mais.
Seja como for. 
É uma dor que dói no peito, pode rir agora
que estou sozinha.

(...)
Quando as estrelas começarem a cair
me diz, me diz
pr'onde é que a gente vai fugir?

Para Daniel Albuquerque
+22/12/2010.

nº 02

Estar sozinha com você era o que eu mais queria neste momento. Queria tempo para fugir contigo pra qualquer lugar, prum bar, pro teu apartamento, pra beira do mar, juntar nossas mãos. Queria teu cheiro amadeirado, teu sorriso, teu corpo...  Queria tua companhia, tua opinião, teu colo... Você sempre foi mais que um velho amigo. Primeiro, segundo ou terceiro amor... não importa qual a ordem, você é o mais especial de todos, o melhor de todos, o que sempre permaneceu do meu lado. Um dia, um de nós terá que deixar o outro, mas que não seja agora, hoje à noite ou amanhã. Preciso de você... Preciso sentir você perto; saber que você se importa com tudo... Não precisa, mas isso faz bem pro ego. Adoro quando você é cúmplice dos pequenos delitos que pratico contra mim mesma. Sei que você ainda não decidiu se vai, se fica; mas eu só quero que você entenda que para mim, nada mudou. Continuamos os mesmos. Meu sentimento por você é o mesmo de cinco anos atrás. A estrada está ficando escura e esburacada, a tempestade dá medo mas ainda temos coragem, não temos? Então, podemos ficar sozinhos? Tocar você não me machuca mais, não me importo mais... no final somos só nós dois mesmo! Ou continuamos ou acabaremos seguindo por caminhos diferentes. O amor é um jogo de azar, não precisamos unir sexo com tanta cobrança. Somos melhores livres. Espero que você entenda... Te gosto, mas isso é só de vez em quando, e quando a crise de abstinência de você me ataca, preciso te consumir.

Quando se cria asas...


Abriu a porta. Todas as luzes do apartamento estavam apagadas. Jogou a bolsa no aparador decorado por um ramo de qualquer flor artificial. Deitou-se no sofá de cor pastel e acendeu uma pequena luminária. 
Tinha nas mãos um pequeno pedaço de papel ensopado por lágrimas. As lágrimas que estavam contidas no papel amarelo não eram dela.Num impulso, jogou aquela coisa pela janela do décimo oitavo andar.
Tirou os sapatos, o vestido, soltou os cabelos e seguiu para o chuveiro. Saiu do banheiro ainda molhada. colocou-se diante do espelho do quarto munida de uma tesoura. Cortou os cabelos.
Foi à cozinha. Pegou uma taça e uma garrafa de vinho. Afogou todas as suas mágoas e dormiu.
No dia seguinte, era como se nada tivesse acontecido.


"É doce morrer no mar
Nas ondas verdes do mar"

Lenine - É doce morrer no mar

nº 1


Queria te contar aquilo sobre mim que eu sei que você já sabe.
Deixo transparecer tantas verdades nas aparências que te minto. 
Minto para ti e para todos os outros que me perguntarem. 
Não assumo, sumo. 
Minto para ti, para o mundo e para mim, nesse infinito jogo de meias verdades de meu coração.
Minto para você e sofro por isso.

Sem razão de exisitir

Um ET.
Uma criatura deslocada.
Um ser que não tem razão
de existir.
Pra que mesmo nasci?
Decepção
é sempre assim.
Amarga
como doce de caju queimado.

Meu quarto
sem travesseiro,
sem saída,
vida sem roteiro.
Eu no escuro,
Perdida em mim
Sofrendo do mesmo castigo
que Caim